Por Marcelo Martini
Um levantamento da Confederação Nacional do Transporte (CNT), divulgado em 2024, mostrou que os congestionamentos nas principais cidades brasileiras cresceram em média 17% em comparação ao ano anterior.
Esse aumento reflete o crescimento contínuo da frota e revela um efeito que vai além da perda de tempo no deslocamento.
O tráfego intenso altera a maneira como os veículos são utilizados e os coloca em uma categoria que a maioria dos motoristas ainda desconhece, que são as chamadas condições severas de uso.
A associação comum, quando se fala em uso severo, costuma remeter a situações específicas, como dirigir em estradas de terra, enfrentar poeira constante ou carregar excesso de peso.
Entretanto, o cotidiano dos grandes centros urbanos reúne fatores que enquadram os veículos na mesma condição, como trajetos curtos, paradas prolongadas em congestionamentos e variações de temperatura, que formam um conjunto de situações que reduzem a eficiência do motor e dos sistemas de apoio.
De acordo com pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), 36% da população que vive nas grandes cidades permanece mais de uma hora por dia no trânsito.
Esse tempo é suficiente para comprometer o funcionamento regular do motor, uma vez que em deslocamentos reduzidos e em tráfego pesado, a temperatura ideal de operação muitas vezes não é atingida.
Isso afeta diretamente a ação dos lubrificantes, que perdem a capacidade de proteger adequadamente as superfícies internas, resultando em maior atrito, acúmulo de resíduos e aceleração do desgaste das peças.
Por outro lado, o problema não se restringe apenas ao congestionamento, em regiões do país em que a temperatura média supera 35 graus, o esforço térmico sobre os componentes é contínuo.
Nas áreas de clima frio, como ocorre em parte da região Sul, a viscosidade dos fluidos aumenta nos momentos iniciais de funcionamento, retardando a lubrificação adequada.
Esses fatores, somados, ampliam o regime de uso severo mesmo quando os veículos são utilizados em condições aparentemente comuns.
A importância da manutenção adequada em casos de condições severas de uso
As consequências do uso severo aparecem em diferentes sistemas do veículo e exigem atenção constante.
O óleo se degrada em ritmo mais acelerado, o filtro acumula impurezas em intervalos mais curtos, o sistema de arrefecimento é submetido a esforço contínuo e o catalisador perde eficiência antecipadamente.
A bomba de combustível, que trabalha sob ciclos frequentes e irregulares, sofre desgaste adicional, o que aumenta a probabilidade de falhas inesperadas e amplia os custos de reparo.
Ignorar esses sinais compromete não apenas o desempenho imediato, mas também a durabilidade do conjunto mecânico.
O erro mais comum entre os motoristas é confiar unicamente no cronograma padrão previsto no manual do veículo, sem observar que os fabricantes já estabelecem um calendário específico para situações de uso severo.
Nessas condições, revisões precisam ocorrer em intervalos reduzidos, sobretudo no que se refere à troca de óleo e fluidos.
Também é necessário acompanhar com mais rigor o estado do sistema de ignição, verificar periodicamente as velas e inspecionar o funcionamento do arrefecimento.
Atrasar essas intervenções acelera o desgaste interno, eleva o consumo de combustível, aumenta a emissão de poluentes e encurta significativamente a vida útil do motor.
O papel dos lubrificantes no uso severo
Nesse cenário, os lubrificantes não se limitam a reduzir o atrito entre as peças móveis, mas criam uma película protetora que impede o contato direto das superfícies metálicas, auxiliam na remoção dos resíduos formados durante a combustão, contribuem para o controle da temperatura interna e garantem a limpeza do sistema.
Para isso, a indústria tem investido no desenvolvimento de formulações com maior resistência à oxidação e ao estresse térmico, porém esses avanços só se traduzem em benefícios concretos quando o motorista utiliza produtos certificados e adequados às especificações técnicas de cada modelo.
A negligência em relação a esse tema traz impactos que vão além do veículo individual. Uma frota que circula em condições inadequadas aumenta a probabilidade de acidentes, amplia a emissão de poluentes e gera custos adicionais para o sistema de mobilidade como um todo.
Oficinas mais sobrecarregadas, maior descarte de peças e fluidos e interrupções frequentes no transporte reduzem a produtividade das cidades e pressionam a economia.
O problema, portanto, deixa de ser apenas técnico e se transforma em questão de interesse público.
O crescimento do trânsito urbano, com a predominância dos deslocamentos curtos e a exposição a congestionamentos demonstram que a maior parte da frota brasileira já se enquadra em regime de uso severo.
Incorporar esse entendimento à cultura de manutenção é condição indispensável para prolongar a vida útil dos veículos, reduzir custos inesperados, melhorar a eficiência energética e garantir a segurança dos usuários.

Marcelo Martini é Gerente de Vendas do Aftermarket da FUCHS, maior fabricante independente de lubrificantes e produtos relacionados do mundo.
